Yanomami pede solução rápida para invasão de terra indígena por garimpo ilegal

quinta-feira, 27 de outubro de 2011
Disponível em: http://amapanocongresso.blogspot.com/2011/10/yanomami-pede-solucao-rapida-para.html

Subprocuradora denuncia falta de ação da Polícia Federal; delegado alega falta de recursos e dificuldades logísticas, além de falha na legislação de crimes ambientais.
Leonardo Prado

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Davi Kopenawa Yanomami (presidente da Hutukura Associação Yanomami)

 

Davi Kopenawa: a invasão por garimpeiros polui rios e terras e transmite doenças, como a malária.
O presidente da Hutukura Associação Yanomami, Davi Kopenawa Yanomami, pediu nesta quinta-feira (27) uma solução rápida, ainda neste ano, para a invasão das terras do povo Yanomami por garimpo ilegal, nos estados de Roraima e Amazonas. Em audiência pública da Comissão da Amazônia, Integração Nacional e Desenvolvimento Regional, ele disse estar revoltado com a invasão da área por garimpeiros, que estariam poluindo os rios e as terras e transmitindo aos índios doenças, como a malária.
De acordo com a deputada Janete Capiberibe (PSB-AP), que solicitou a realização do debate, pelo menos 1.500 garimpeiros exploram ilegalmente a área. As terras Yanomami foram demarcadas em 1992. A Constituição garante o direito dos índios à terra e ao usufruto exclusivo de seus recursos naturais.
O líder indígena pediu a ação da Polícia Federal para retirar os invasores. “Para os garimpeiros, é fácil entrar; a Polícia Federal diz que é difícil, mas eles têm helicópteros e aviões”, ressaltou. Para Davi Kopenawa, os garimpeiros voltam quando são expulsos porque não são punidos.
Dificuldades


O delegado de Polícia Federal Alexandre Ramagem Rodrigues, que representou o Ministério da Justiça na audiência, afirmou que a Polícia Federal está agindo no local, mas precisa de uma legislação mais rigorosa para realizar seu trabalho. A Lei dos Crimes Ambientais (9.605/98) prevê pena de detenção de seis meses a um ano e multa para quem executar pesquisa, lavra ou extração de recursos minerais sem autorização, permissão, concessão ou licença. “A pena de seis meses a um ano significa que a pessoa não fica presa”, destacou.



Rodrigues também destacou as dificuldades de orçamento, de pessoal e de logística para as operações de repressão à atividade. “Não temos aeronaves disponíveis a qualquer momento”, mencionou. Conforme o delegado, muitas vezes quando a operação da PF chega a um local onde foi denunciada a atividade ilegal, já houve deslocamento dos garimpeiros para outros locais. Além disso, ele afirmou que a destruição das pistas de pouso utilizadas para garimpo vem sendo realizadas pela PF, mas tem se mostrado ineficaz, “pois em 15 dias são construídas novas pistas”. Ele chamou atenção ainda para a extensão do território Yanomami – cerca de 9,5 milhões de hectares – e para a dificuldade de acesso a ele. “É um povo que vive em floresta densa, montanhosa, com pouco ou nenhum contato com a civilização branca”, explicou.


Serviço de inteligência
Para a vice-procuradora da República Déborah Druprat e para a representante do Instituto Socioambiental, Ana Paula Souto Maior, mesmo sem alteração da legislação, a atividade de garimpo ilegal poderia ser reprimida.
A vice-procuradora contestou a declaração do delegado de que a PF está fazendo tudo que é possível. Segundo ela, o papel da Polícia Federal seria apresentar um serviço de inteligência, com resposta para a pergunta: “quem financia o garimpo?” – o que não foi realizado. Ela também criticou a PF por não investigar a compra do ouro extraído de forma ilícita. “A economia do ouro como um todo não é fiscalizada e nem punida”, alertou. “Por que o monitoramento da área por satélite não é realizado?”, questionou ainda.
A representante do Instituto Socioambiental também pediu a mudança no perfil de atuação da PF, com trabalho de inteligência que identifique a dinâmica do garimpo. Ela destacou que os garimpeiros que exploram a região são extremamente pobres, e que “alguém” financia as pistas, os aviões e os voos para a região. “Outras pessoas ganham com esse crime, e são essas pessoas que devem ser punidas”. Para ela, o combate ao garimpo ilegal deve envolver a geração de empregos na região para a camada pobre da população que hoje exerce a atividade.
Repressão insuficiente
O coordenador-geral de Índios Isoladas e Recém Contratados da Fundação Nacional do Índio (Funai), Carlos Lisboa Travassos, também destacou que a repressão aos atuais garimpeiros é insuficiente para resolver o problema. Ele afirmou que é necessária uma aproximação da Funai com a Polícia Federal, o Ministério da Defesa, o Ministério Público, entre órgãos, para buscar uma solução conjunta para o problema. Ele informou que a Funai faz monitoramento da área, mas há dificuldades de orçamento e de pessoal para o trabalho. “O relatório com levantamento de pistas de pouso e balsas de garimpo na região foi encaminhado ao Ministério da Justiça, solicitando o apoio necessário para o combate à atividade ilícita”, informou.
O diretor de Fiscalização do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), ligado ao Ministério de Minas e Energia, Walter Lins Arcoverde, sugeriu a criação de “grupo força-tarefa” com todos os órgãos participantes da audiência para tentar encontrar uma solução definitiva ao problema. Arcoverde disse ainda que o ministério pode contribuir, por exemplo, com a liberação de recursos para o aluguel de aeronaves para a repressão ao garimpo ilegal. A deputada Janete Capiberibe afirmou que a comissão continuará trabalhando pela solução do problema. “A realização da audiência foi apenas o início desse trabalho”, disse.

Reportagem – Lara Haje
Edição – Regina Céli Assumpção

Deborah Duprat participa de audiência sobre exploração de ouro em terra indígena

Por  Secom/Procuradoria Geral da República

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A Vice-PGR afirmou que “o simples fato de se estar extraindo ouro sem autorização do DNPM já configura ilícito.

vice-procuradora-geral da República Déborah Duprat participou ontem, 27 de outubro, de uma audiência pública, na Câmara dos Deputados, que tratou de violações dos direitos dos povos yanomami. A audiência, organizada pela Comissão da Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional, teve o objetivo de discutir medidas para coibir a extração de recursos minerais em terras indígenas, o que não é permitido pela Constituição da República.

Duprat é coordenadora da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, colegiado dedicado à temática das populações indígenas e comunidades tradicionais. Na audiência pública, ela esclareceu a missão da 6ª CCR de, entre outra atribuições, “chamar os órgãos responsáveis para pôr fim em situações de irregularidade em terras indígenas”. A respeito da situação ilegal de garimpo nessas áreas, Deborah afirmou já ter participado, desde o final da década de 90, de inúmeras reuniões com representantes de órgãos do Poder Executivo com o objetivo de que somar esforços no sentido de desenvolver ações para pôr fim ao garimpo.

Entretanto, Duprat lamentou que os resultados dessas reuniões nunca foram efetivamente desenvolvidos. De acordo com a coordenadora da 6ª CCR, “o que nós conseguimos de efetivo, até hoje, foram operações policiais esporádicas, que são importantes, mas cuja eficácia dura cinco dias”. Duprat cobrou, da Polícia Federal e da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), a elaboração de um relatório de inteligência que indique quais atores financiam a garimpagem nas terras indígenas. “Não somos tolos o suficiente para achar que são os garimpeiros que compram aquelas dragas, que mobilizam aeronaves para levar mantimentos ao garimpo. Há um mercado do garimpo que precisa de investigação”, afirmou a subprocuradora.

O mercado do ouro que envolve a garimpagem em terras indígenas movimenta também diversas aeronaves de pequeno porte e helicópteros que decolam, diariamente, do aeroporto internacional de Boa Vista com destino às áreas de garimpo ilegal. Duprat questionou à Agência Nacional de Avião Civil (Anac) sobre os plano de voos dessas aeronaves. “Afinal, se decolam de Boa Vista e vão para pistas clandestinas e a Anac, verificando que essas aeronaves não foram para o local indicado no plano de voo, por que essas aeronaves não são apreendidas?”, questiona Deborah.

A atuação da Receita Federal também foi cobrada pela vice-procuradora-geral da República. Boa parte do ouro extraído ilegalmente das terras yanomami são vendidos no comércio de Boa Vista, em Roraima. Duprat afirma que esses comerciantes praticam crime de receptação, visto que a origem do produto vendido é ilegal, feita sem autorização do Departamento Nacional de Produção Mineral (DPNM). Duprat afirmou que “o simples fato de se estar extraindo ouro sem autorização do DNPM já configura ilícito. Então, nós queremos saber por que essa economia do ouro não é fiscalizada e punida”.

Ao fim de sua exposição, Deborah afirmou que a extração ilegal de ouro em terras indígenas só será combatida se houver uma ação coordenada entre os diversos órgãos públicos envolvidos com a questão. Ela enfatizou que “primeiro, temos que pensar em agir, cada  órgão e cada instituição, dentro do seu papel. Esse contexto se resolve pela atuação normal dos órgãos”.

Além dos deputados federais que participaram da audiência pública, estiveram presentes Davi Kopenawa Yanomami, presidente da Hutukura Associação Yanomami, e representantes dos ministérios da Justiça e da Defesa, da Fundação Nacional do Índio (Funai), do Departamento de Polícia Federal (DPF), do Departamento Nacional de Produção Mineral (DPNM), e do Instituto Socioambiental (ISA).

Garimpo na terra yanomami: violência e ganância.

Quinta, 27 de outubro de 2011, 07h29

Por Felipe Milanez De São Paulo
Disponivel em: http://terramagazine.terra.com.br/interna/0%2c%2cOI5437416-EI16863%2c00-Garimpo+na+terra+yanomami+violencia+e+ganancia.html

Genocídio. Invasão. Guerra. Contaminação por mercúrio, malária, doenças infecciosas. Quando se fala em garimpos ilegais de ouro na terra indígena yanomami, é como se dezenas de cavaleiros do apocalipse (sim, da cultura ocidental) começassem a marchar. Ao menos, essa é a imagem que vem à cabeça, ilustrada e contrapostas por fotografias emblemáticas de Cláudia Andujar.

Essas faces da morte são cortadas com uma frase afiada: "eu não tenho medo de morrer", me diz Davi Kopenawa Yanomami.

O drama vivido pelo povo yanomami nos anos 80, que chocou o mundo, começa a se reconstituir. Garimpeiros ilegais invadiram a reserva e lá estão estabelecidos nesse momento.

Para quem acompanha de perto essa invasão, que começa sorrateira, mas que no desvio dos olhares disfarçados, ganha corpo, volume, e poder de enfrentamento, não está surpreso pelo que foi mostrado recentemente na TV. Há anos Kopenawa bate na mesma tecla: a terra indígena yanomami está sendo invadida por garimpeiros. Garimpeiros, que seu povo chama de warari koxi que seria, segundo ele, porco de casa ("porco que faz buraco no mato, suja tudo, e come esterco"). E a falta do eco de seus gritos fez com que o número de invasores se multiplicassem.

São cada vez mais tantos garimpeiros que, esperam os políticos do estado de Roraima, seja enfim dado a trágica invasão o título de "fato consumado" - o Estado, criado pela Constituição Federal de 1988, sempre se posicionou contra a demarcação de terras indígenas. E para discutir esse difícil tema, uma complexa audiência terá lugar na Câmara dos Deputados na manha desta quinta-feira 27.

Uma audiência na Comissão de Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional, tem como pauta confirmada o tema de "Violação dos Direitos do Povo Yanomami ", pelos Requerimentos nº 84/2011 e nº 100/2011 da Deputada Janete Capiberibe e Requerimento nº 139/2011 do Deputado Domingos Dutra. Nela, vão expor o Ministro da Justiça José Eduardo Cardoso, o ministro da defesa, Celso Amorim, o presidente da Funai, Márcio Meira, o diretor da Polícia Federal, Leandro Coimbra, junto do Diretor-Geral do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), Sérgio Dâmaso, e a vice-procuradora da República, Débora Duprat, além da advogada Ana Paula Souto Maior, do Instituto Socioambiental (ISA). Tanto poder junto, bastaria um sopro para que os garimpeiros, que são pessoas pobres em busca de um lucro rápido, manipulados por uma elite invisível, sumissem da área yanomami. Mas não parece ser essa a direção que irá tomar toda a força política que estará reunida.

Por isso, no mesmo ambiente, está Davi Kopenawa Yanomami.

Davi, me descreveu certa vez o cientista Antônio Nobre, "é o Einstein da Amazônia". Por ai, publicam de vez em quando que ele seria o "Dalai Lama da Amazônia." Na verdade, Kopenawa é um líder (tanto na acepção política, quanto espiritual) do povo yanomami - e outras comparações podem parecer desnecessárias, ou até mesmo, etnocêntricas.

A presença de Davi, em meio aos engravatados, se faz necessária.

É provável que o ambiente seja invadido por fantasmas. Não apenas dos tantos yanomamis mortos por malárias e conflitos com os garimpeiros, nem só os 19 espíritos daqueles yanomami massacrados pelo genocídio de Haximu. Mas almas infecundas que ressurgem das trevas autoritárias sempre que o sentimento de uma suposta união do povo brasileiro encontra o inimigo índio: a internacionalização da Amazônia. Esses são os "fantasmas convenientes".

Sempre que convém à elite, ou aos que estão se beneficiando de um jogo ilegal de poder, seja militar, seja fazendeiro, seja garimpeiro, são evocados os fantasmas da "internacionalização" - que seriam, segundo essa teoria, capitaneadas por armas e recursos internacionais usando fantoches índios. Os "índios" são vistos como indefesos alienígenas na floresta> Floresta que, quando menciona, Davi o faz com profundo respeito. Não apenas porque os índios ocupam essa floresta há pelo menos dez mil anos, mas, como mostra a arqueologia e a etnobotância, eles ajudaram a modelar e a transformar a biodiversidade nessa longa ocupação.

Capitaneando oportunamente o lado conspiratório da internacionalização, está o deputado Paulo Cesar Quartiero, personagem sempre presente quando se discute direitos indígenas, sobretudo, após a demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol (ele possuía uma fazenda, cuja posse foi considerada ilegal e de má-fé e recebeu apenas algumas benfeitorias). "Na Amazônia está sendo feita a política da terra arrasada. O que é a política da terra arrasada, é o que os russos fizeram quando o exército alemão invadiu a Rússia: eles se retiraram e destruíram tudo, para não dar maneira de o exército alemão subsistir". Por isso, explica o migrante gaúcho, integrante da leva que invadiu a Amazônia durante o tempo da ditadura militar, a atividade econômica, palavras de Quartiero, estaria sendo proibida na Amazônia - o garimpo é visto como uma atividade econômica, assim como suas plantações de arroz. Sem atividade econômica, a floresta seria "terra arrasada" (visão oposta da de Davi sobre o mesmo meio ambiente). Desta feita, impedir atividade econômica, e destinar terra aos índios, seria abrir as portas para uma invasão estrangeira.

Conversei com Kopenawa sobre o que ele espera da audiência.

Terra Magazine - Qual expectativa?
Davi Kopenawa Yanomami - Eu acho que é importante discutir a nossa situação. Nosso problema da terra yanomami, que nunca vai ficar livre, vai sempre ter problema antigo. É importante a gente conversar sobre os garimpos. A garimpagem que está deixando a gente ficar revoltado. Já está repetindo como o que aconteceu em 1986. Isso está voltando de novo. Eu, yanomami, quero conversar com autoridade não-índio, com gente que apoia a nossa luta, para quebrar a força de quem esta contra nós, contra povo indígena e a terra indígena.

As autoridades são aliadas?
Eu sei que as autoridades, os próprios senadores e deputados, fizeram uma lei que tem que ser respeitado. A lei fala que não pode o branco garimpar na terra. Acho que eles esqueceram. Esqueceram. Não querem mais lembrar. Eu falo que eles não querem respeitar o que a lei que fala. O artigo 231 da Constituição. Todo mundo sabe. Foram eles que fizeram. Os brancos que fizeram essa lei, mas eles não tão respeitando a lei deles. A terra está demarcada, homologada, registrada. Todo mundo sabe disso. Essa foi a maior luta, foi muito difícil. E estão querendo mexer de novo. Eu quero que o homem branco respeite o meu povo yanomami.

Querem mudar a lei? Criar uma lei para permitir a mineração em terras indígenas. O senhor concorda?
Eu não queria mudar a lei. A lei esta no papel. A lei é a Constituição Federal. Esse é o papel. Para mudar a lei, acho que pra mim não é bom fazer isso. Não é bom porque vai prejudicar a terra indígena, e o povo indígena que mora na terra dele. Vai prejudicar, e ficar mais difícil. Se mudar a lei, para ter mineração, vão deixar sofrer os povos indígenas do Brasil.

O genocídio que o povo yanomami sofreu, no massacre de Haximu, faz com que o seu povo tema ainda mais os garimpeiros?
Naquela vez, quem deixou garimpeiros entrar foi o presidente da Funai na época. Foi ele quem criou esse problema. Eu não gosto de falar o nome dele refere-se ao atual senador Romero Jucá. Ele que estragou o trabalho da Funai, ele que derramou os garimpeiros lá, que derramou sangue. Mas eu não tenho medo de morrer. ninguém está roubando e levando como branco faz. Nós somos de lá. Nós somos da terra yanomami, nascemos há muitos anos, há mais de 500 anos que meu povo está la. Eu não tenho medo de morrer, eu não sou ladrão. Nós temos direitos. Temos o direito de viver em paz. É a nossa terra ali.

O povo yanomami quer se separar do Brasil?
Nãoo. Nós somos brasileiros. Nós, os yanomami brasileiros, não queremos ficar separados do Brasil. Isso inventaram. Branco inventa isso. Branco pensa que nós vamos separar, que nos vamos fazer outro pais independente. Esse é o pensamento dele. A consciência do povo yanomami é permanecer morando na sua própria terra, onde nasceram, viveram muito anos, onde o criador criou nos, criou nossa terra, nosso alimento, nossa raiz. Nós, povo yanomami, não estamos pensando em ficar separado. Queremos é a terra demarcada. Foi o governo quem demarcou a terra. Eles que inventaram demarcar terra. Nós queremos é garantir a lei, e não estão garantindo a lei por causa da riqueza da terra.

Felipe Milanez é jornalista e advogado, mestre em ciência política pela Universidade de Toulouse, França. Foi editor da revista Brasil Indígena, da Funai, e da revista National Geographic Brasil, trabalhos nos quais se especializou em admirar e respeitar o Brasil profundo e multiétnico.

Fale com Felipe Milanez: This email address is being protected from spambots. You need JavaScript enabled to view it.

 

RCA realiza oficina sobre o direito de consulta prévia no Brasil

Disponível em: http://rcabrasil.blogspot.com/2011/10/rca-realiza-oficina-sobre-o-direito-de.html

Entre os dias 9 e 12 de outubro de 2011, cerca de 40 representantes de organizações indígenas e indigenistas participaram, em Brasília – DF, da oficina-seminário sobre o direito de consulta prévia aos povos indígenas no Brasil, promovida pela Rede de Cooperação Alternativa - RCA. Reunindo representantes de 10 organizações indígenas (Atix, Apina, Arpinsul, CIR, Foirn, Hutukara, Opiac, Oprimt, Wyty-Catë, Comissão Yvy Rupa) e 5 organizações indigenistas (CTI, CPI-AC, Iepé, ISA, Inesc), a oficina-seminário contou com o apoio da Embaixada da Noruega no Brasil e da Rainforest Foundation Noruega, e foi realizada em parceria com a Associação Brasileira de Antropologia (ABA), o Ministério Público Federal (MPF), o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) e o Centro de Pesquisa e Pós-Graduação sobre as Américas (Ceppac) da Universidade de Brasília.

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Seminário - Um seminário internacional, realizado na UnB, no dia 10 de outubro, trouxe para o debate a experiência de países vizinhos na regulamentação do direito da consulta prévia previsto na Convenção 169 da OIT. Especialistas do Chile, Peru, Bolívia e Equador relataram como esses países estão avançando na regulamentação deste direito, frente à diversidade étnica e cultural existente em seus países. Casos concretos sobre a aplicação do direito de consulta prévia, tanto em termos de medidas administrativas quanto legislativas, foram apresentados. O seminário também contou com especialistas brasileiros que foram unânimes em afirmar a necessidade do Estado brasileiro regulamentar a aplicação deste direito no País.

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Oficina - Já na oficina, realizada nos dias 9, 11 e 12 de outubro, os participantes puderam se debruçar atentamente sobre os instrumentos legais que garantem o direito dos povos indígenas de serem ouvidos e consultados antes que medidas administrativas e legislativas que afetem seus modos de vida e seus territórios sejam tomadas. Para os participantes da oficina, o direito de consulta livre, prévia e informada deve ser compreendido como um instrumento de diálogo entre os povos indígenas e o Estado, cujo objetivo é garantir a participação efetiva na tomada de decisões que envolvam direitos coletivos dos povos indígenas. Seu papel é colocar em prática o conjunto de direitos substantivos reconhecidos aos povos indígenas pela Constituição Federal e pelas normas e instrumentos nacionais e internacionais sobre povos indígenas vigentes no país.

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Regulamentando a Consulta Prévia - Para os participantes da oficina, a Consulta Livre, Prévia e Informada deve ser entendida como um processo e não como um evento, como um importante instrumento de diálogo entre o Estado e os povos indígenas, que deve considerar a diversidade étnica existente no país, sendo flexível tanto nos procedimentos para cada consulta como no tempo necessário para sua execução. Afirmando que os processos de consulta prévia devem ser realizados de boa fé, com apresentação de informação verídica, completa e oportuna, manifestando a vontade do Estado de chegar a um acordo ou obter o consentimento dos povos indígenas, quando medidas administrativas ou legislativas os afetarem, os participantes recomendaram que os processos de consulta devem ser públicos, livres de qualquer tipo de pressão política, econômica ou moral e que devem respeitar as formas próprias de representação e de tomada de decisão dos povos indígenas participantes da consulta. Foi discutido também que o resultado do processo de consulta deve incorporar e respeitar a decisão dos povos indígenas.

Para a regulamentação deste direito no Brasil, os participantes da oficina recomendam que o Estado brasileiro o faça de modo participativo, ouvindo as organizações indígenas e da sociedade civil, e que não haja um fracionamento setorial dos procedimentos de consulta, mas sim a unificação de procedimentos em um instrumento para medidas administrativas e outro para medidas legislativas.

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Apresentação das Propostas - No segundo dia da oficina, o ministro chefe da Divisão de Temas Sociais do Itamaraty, Sílvio Albuquerque, recebeu uma comitiva dos participantes do evento. Ele manifestou o interesse do governo de avançar na regulamentação do direito de consulta em conjunto com os povos indígenas e comunidades quilombolas, que também são consideradas como sujeitos da Convenção 169 da OIT pelo Estado brasileiro. Albuquerque demonstrou receptividade a idéia de empreender um diálogo democrático com as populações interessadas no assunto, anunciando a organização de um seminário em dezembro, reunindo representantes da sociedade civil (índios e quilombolas), especialistas e representantes de órgãos de governo para avançar na discussão sobre a regulamentação deste direito.

Os organizadores da oficina, bem como os participantes indígenas e indigenistas, esperam que este primeiro momento de debate público seja o início de um processo amplo e sistemático de dialogo entre o Estado e a sociedade civil sobre o tema.

Veja abaixo o documento final produzido durante a oficina e encaminhado ao Governo brasileiro:

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Documento Final
Oficina-seminário sobre conteúdo e regras de aplicação do direito de consulta livre, prévia e informada no Brasil


A Rede de Cooperação Alternativa (RCA), juntamente com a Associação Brasileira de Antropologia (ABA), o Ministério Público Federal (MPF), o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) e o Centro de Pesquisa e Pós-Graduação sobre as Américas (Ceppac), da Universidade de Brasília, promoveram, entre os dias 9 e 12 de outubro de 2011, uma oficina-seminário sobre a aplicação do Direito de Consulta Livre, Prévia e Informada (CLPI) dos povos indígenas e comunidades tradicionais no Brasil.

Congregando cerca de 40 participantes, entre representantes das organizações indígenas Atix, Apina, Arpinsul, CIR, Foirn, Hutukara, Opiac, Oprimt, Wyty-Catë, Comissão Yvy Rupa, bem como das organizações indigenistas CPI-AC, CTI, Iepé, Inesc, ISA e especialistas na matéria, o objetivo do evento foi debater o conteúdo e o alcance do Direito de Consulta Livre, Prévia e Informada (CLPI) dos povos indígenas previsto na legislação nacional e internacional, assim como trabalhar na elaboração de uma proposta preliminar de diretrizes que orientem a regulamentação e aplicação deste direito no Brasil.

Para as organizações participantes do evento o Direito de Consulta Livre, Prévia e Informada é compreendido como um instrumento de dialogo entre os povos indígenas e o Estado, que visa garantir o direito à participação efetiva no processo de tomada de decisões legislativas e administrativas que envolvam direitos coletivos dos povos indígenas. Portanto, sua natureza é estritamente instrumental é acessória ao conjunto de direitos substantivos reconhecidos aos povos indígenas, tanto na Constituição Federal como nas demais normas e instrumentos nacionais e internacionais sobre povos indígenas vigentes no país.

A seguir são apresentadas recomendações referentes ao processo de regulamentação do Direito de Consulta Livre, Prévia e Informada, bem como ao conteúdo e alcance do mesmo, debatidos e deliberados no evento.

Princípios e regras gerais de aplicação:

* Diálogo. A Consulta Livre, Prévia e Informada deve ser entendida como um processo e não como um evento, como um instrumento de diálogo entre o Estado e os povos indígenas.
* Flexibilidade. A aplicação deste direito deve atender a diversidade étnica existente no país, sendo flexível tanto nos procedimentos para cada consulta como no tempo necessário para sua execução.
* Boa fé. Os processos de consulta devem ser realizados de boa fé, com apresentação de informação verídica, completa e oportuna. A boa fé deve também se manifestar na vontade do Estado de chegar a um acordo ou obter o consentimento dos povos indígenas.
* Transparente. Os processos de consulta devem ser públicos e divulgados de forma adequada aos povos indígenas.
* Livre. Os processos de consulta devem ser livres de qualquer tipo de pressão política, econômica ou moral.
* Representatividade indígena. Os processos de consulta devem respeitar as formas próprias de representação e de tomada de decisão dos povos indígenas participantes da consulta.
* Vinculante. O resultado do processo de consulta deve incorporar e respeitar a decisão dos povos indígenas.
* Responsabilidade pública. Os processos de consultas somente deverão ser realizados pelo Estado. O Estado deve garantir os recursos necessários para a execução de todo o processo, incluída a articulação e a preparação dos povos indígenas.
* Participativo. As regras do processo de consulta deverão ser decididas conjuntamente entre os povos indígenas afetados e o Estado.

1. I.             Recomendações sobre o processo de regulamentação do direito de consulta prévia:

* A regulamentação deste direito deverá ser feita por meio de um processo amplamente participativo, segundo regras e procedimentos previamente acordados com os próprios povos indígenas e suas organizações representativas.
* O Estado deverá garantir aos povos indígenas tempo suficiente para a discussão, reflexão e deliberação sobre o assunto.
* O Estado deverá garantir informação suficiente, adequada e oportuna para o processo de consulta.
* O Estado deverá garantir os recursos necessários para o processo de consulta.
* O Estado não deve fracionar a regulamentação setorial dos procedimentos de consulta. Recomenda-se a unificação de procedimentos em um instrumento para medidas administrativas e outro para medidas legislativas

1. II.            Recomendações sobre o conteúdo da regulamentação do direito de consulta prévia:

II.1. Com relação às decisões que devem ser consultadas:

* Todas aquelas decisões, administrativas e legislativas, que afetem os direitos coletivos dos povos indígenas, independentemente deles estarem dentro ou fora das terras indígenas.
* Decisões administrativas de nível federal, municipal e estadual que afetem os direitos coletivos dos povos indígenas.
* Decisões administrativas de caráter geral para toda a população, mas que afetem especificamente direitos coletivos dos povos indígenas.
* Planos, programas e projeto de desenvolvimento nacional, regional, estadual e municipal que afetem povos indígenas.
* Projetos de Decretos Legislativos que autorizam a exploração de recursos hídricos e minerais em determinadas terras indígenas ou em seu entorno.
* Decisões legislativas das Assembléias Legislativas e Câmaras Municipais de caráter geral que afetem os direitos dos povos indígenas.
* As decisões legislativas e administrativas sobre políticas transfronteiriças que afetem direitos coletivos dos povos indígenas de fronteira deverão ser consultadas.
* O poder executivo deve consultar os povos indígenas sobre suas iniciativas legislativas, bem como sobre medidas provisórias que afetem direitos coletivos dos povos indígenas.

II.2. Com relação ao momento oportuno de realizar a consulta:

* O processo de consulta deve ser prévio à decisão administrativa ou legislativa emitida pelo Estado ainda no início dos processos de planejamento.
* O processo de consulta deve ser iniciado pelo Estado, e os povos indígenas têm o direito de solicitar sua realização.
* No caso de medidas legislativas, o processo de consulta deve ocorrer antes da aprovação do relatório final na Câmara dos Deputados e no Senado Federal.
* O Congresso Nacional deve consultar os povos indígenas afetados antes de emitir autorizações para aproveitamento de recursos hídricos ou exploração mineral em terras indígenas. Tais autorizações não podem ser condicionadas á realização posterior de consultas com os povos indígenas.

II.3. Com relação a quem deve realizar a consulta:

* O processo de consulta deve ser feito pelo órgão do Estado com competência para decidir sobre a matéria objeto de consulta, bem seja o Congresso Nacional para o caso de decisões legislativas ou, os órgãos do poder executivo, em todos seus níveis, para os casos de decisões administrativas.
* O Estado deve garantir uma interlocução articulada e coordenada com os povos indígenas envolvendo todos os setores responsáveis pelo conteúdo e execução das decisões objeto da consulta.
* Durante os processos de consulta, além dos povos indígenas e o Estado deve participar um terceiro ator responsável por velar pelo cumprimento das leis. Recomenda-se que o Ministério Público Federal participe de todos os processos de consulta.

II.4. Com relação a quem deve ser consultado:

* Os sujeitos do direito de consulta são os povos indígenas diretamente afetados.
* Os processos de consulta deverão ser realizados com as comunidades indígenas e suas organizações representativas, dependendo do escopo da medida objeto da consulta.
* Quando determinada decisão impacta mais de um povo ou comunidade, o processo de consulta deverá ser executado de forma conjunta por todos os povos e comunidades envolvidas.
* No processo de consulta, a Funai não pode tomar decisões em nome dos povos indígenas.

II.5. Com relação aos procedimentos dos processos de consulta:

* A consulta deve ser compreendida como um processo de várias etapas a serem definidas conjuntamente entre o Estado e os povos indígenas, dependendo do escopo e do conteúdo da medida objeto de consulta.
* As regras do processo de consulta devem ser definidas conjuntamente entre os povos indígenas e o Estado. Tais regras acordadas serão expressas em um Plano de Consulta, que conterá como mínimo:

- Os interlocutores por parte do Estado e dos povos indígenas.
- Os procedimentos adequados (prazo, assessoria técnica e modos de tomada de decisão).
- O cronograma, que deve contemplar o tempo do processo de compreensão e deliberação interna dos povos indígenas.
- A forma em que a informação será disponibilizada, bem como os recursos necessários para sua compreensão.
- Tradução nas línguas dos povos indígenas envolvidos no processo, quando houver necessidade.
- A informação completa, independente e oportuna.

* Informação prévia, em tempo adequado, e que seja garantida as condições para que as comunidades recebam informação de fontes independentes, com assessoria técnica e jurídica escolhida pelos próprios povos indígenas.
* A consulta prévia é específica sobre cada decisão administrativa ou legislativa e não se confunde com os espaços de participação cidadã e de controle social do quais participam representantes dos povos indígenas.
* Todo o processo de consulta deverá estar devidamente documentado, disponível a todos os participantes e amplamente divulgado.

II.6. Sobre os efeitos jurídicos do processo de consulta:

* A consulta tem como objetivo chegar a um acordo ou obter o consentimento dos povos indígenas. Todo acordo produto do processo de consulta é vinculante.
* Nos casos de não acordo, o Estado deverá incorporar na motivação da decisão as razões técnicas e políticas pelas quais não há acordo com os povos indígenas.
* Os resultados e produtos das consultas devem estar refletidos na decisão final, sendo este elemento o principal para qualificar o processo de consulta prévia e diferenciá-lo de qualquer outro tipo de reunião.

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Organizações participantes:

Apina - Conselho das Aldeias Wajãpi
Arpinsul – Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul
Associação Wyty-Catë dos Povos Timbira do Maranhão e Tocantins
CEPPAC – Centro de Pesquisa e Pós-Graduação sobre as Américas
Comissão Yvy Rupa
CPI-AC – Comissão Pró-Índio do Acre
CIR – Conselho Indígena de Roraima
CTI – Centro de Trabalho Indigenista
Foirn – Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro
HAY – Hutukara Associação Yanomami
Iepé – Instituto de Pesquisa e Formação Indígena
Inesc – Instituto de Estudos Socioeconômicos
ISA – Instituto Socioambiental
Opiac– Organização dos Professores Indígenas do Acre
Oprimt – Organização dos Profissionais Indígenas da Educação de Mato Grosso
RCA – Rede de Cooperação Alternativa

Organizações convidadas:

CPPDI – Centro de Políticas Públicas y Derechos Indígenas, Chile
Ciudadania, Bolívia
DAR – Derechos Ambiente y Recursos Naturales, Peru
IEB – Instituto de Educação do Brasil
Fundacion Gaia Amazônica, Colômbia
PUC-PR – Pontifícia Universidade Católica do Paraná
RAMA – Red Jurídica Amazônica, Equador

RCA:Participantes da oficina sobre consulta prévia entregam propostas ao governo brasileiro

Disponível em: http://rcabrasil.blogspot.com/2011/10/participantes-da-oficina-sobre-consulta.html

No último dia 13 de outubro de 2011, representantes de organizações indígenas e indigenistas entregaram formalmente ao Governo Federal os resultados da oficina-seminário sobre o direito Consulta Livre, Prévia e Informada, promovida pela RCA, e manifestaram que querem participar do processo de regulamentação deste direito no Brasil.

Os participantes da oficina da RCA foram recebidos na Secretaria Geral da Presidência da República, pelo Secretário Paulo Maldos, da Secretaria Nacional de Articulação Social, em uma audiência que contou com a presença de representantes de vários ministérios e órgãos federais, entre eles do Ministério da Justiça, Ministério da Cultura, Ministério de Minas e Energia, Casa Civil, Secretaria de Direitos Humanos, Seppir, Funai, Ibama,Dnit, Fundação Palmares, Agência Nacional de Águas e Incra.

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Apresentação de propostas - O secretário-executivo da RCA, Luis Donisete B. Grupioni, relatou os trabalhos desenvolvidos na oficina e no seminário sobre consulta prévia. Enfatizando que os participantes consideram que a consulta prévia tem que se regulamentada de forma participativa, esclareceu que documento que estava sendo entregue se constituía numa primeira contribuição, para abrir o diálogo com o governo e que era preciso ampliar o debate, envolvendo mais organizações indígenas e representantes de quilombolas.

O vice-presidente da Foirn, Maximiliano Menezes, afirmou que os índios não são contra o desenvolvimento do país, mas que querem ser consultados quando obras impactam seus territórios. “Nós queremos ser consultados, seja nas obras, seja na educação, na saúde. Queremos ser ouvidos pelo governo e hoje temos essa possibilidade com o direito da consulta prévia” afirmou. Na mesma linha, o diretor da Foirn, Luiz Brazão, disse “queremos que o governo pense a regulamentação de forma transparente, participativa, que não seja feito em quatro paredes. Queremos fazer parte desta discussão já”.

O diretor da Atix, Vinti Suyá, afirmou que o governo precisa ouvir os índios: “nós somos atropelados pelos empreendimentos. Queremos ser respeitados, queremos ser reconhecidos e ouvidos. Queremos pensar o país junto com vocês, que vocês ouçam nossas palavras e considerem”.

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A representante do ISA, advogada Bivany Garzon, apresentou as linhas gerais do documento elaborado na oficina da RCA, enfatizando as principais contribuições do grupo para a regulamentação do direito de consulta prévia, no que se refere a quem deve ser consultado, por quem, quando, em que condições e o que se espera da consulta: “Para nós, a consulta tem caráter vinculante. Caso não se chegue a um acordo ou consentimento, o Estado tem que incorporar na motivação da decisão, as razões técnicas e políticas pelas quais o acordo não foi possível”.

Reação do governo - O Secretário Nacional, Paulo Maldos, enfatizou o interesse do Governo Federal em receber a contribuição das organizações indígenas e indigenistas sobre o tema, afirmando que as contribuições são bem vindas. Paulo Maldos afirmou que o governo vem ampliando, nos últimos anos, sua capacidade de planejamento e que é importante consultar os índios já nessa fase. Disse também que é “bem recebida a proposta de uma consulta da consulta”, de modo que a própria regulamentação deste dispositivo já seja um exercício desse processo de consulta e diálogo com os povos indígenas, e que o documento da RCA pode ser “uma boa plataforma para o governo dar seguimento ao tema”.

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O vice-presidente da Funai, Aloisio Guapindaia, afirmou que o governo entende ser necessário regulamentar o dispositivo da consulta prévia e que fizeram uma reunião com o relator da ONU, James Anaya, sobre o assunto. Ele relatou que o governo tem se reunido para que os diferentes órgãos tomem conhecimento do regime da consulta e que há necessidade de avançar nesse processo, havendo interesse em ter um acordo sobre a regulamentação da OIT em curto espaço de tempo.

Ivonete Carvalho, representante da Seppir, destacou a importância do momento, em que as organizações indígenas e indigenistas apresentavam contribuições para a regulamentação do direito de consulta prévia, afirmando que o tema tem que ser objeto de um amplo processo participativo. Referindo-se ao seminário que o governo federal pretende realizar em dezembro, momento de diálogo entre o governo, os índios e quilombolas, Ivonete disse que o governo precisa conversar entre si, refletindo como cada ministério irá lidar com a regulamentação. “A questão indígena não é só assunto da Funai, mas tem a ver com o governo como um todo. O governo não tem a pretensão de falar em nome dos índios nem dos quilombolas.Essa contribuição de vocês vai aportar qualidade ao processo de regulamentação da consulta prévia”, afirmou.