Discurso da senadora Ângela Portela‏ sobre Projeto Vigilância do Limite Leste

Leia o documento


PRONUNCIAMENTO QUE FAZ NO PLENÁRIO DO SENADO FEDERAL A SENADORA ÂNGELA PORTELA, DO PT DE RORAIMA, EM 29 DE NOVEMBRO DE 2012


Senhoras e Senhores Senadores da República.  

Um velho problema continua a tirar o sossego dos povos da Terra Indígena Yanomami (TIY), em Roraima: a invasão de suas terras, de suas culturas e de suas vidas, pela ação do homem branco.
Nos próximos dias, autoridades federais irão receber um documento assinado por lideranças indígenas de meu Estado, pedindo providências cabíveis e medidas urgentes, para a invasão das terras indígenas por fazendeiros, garimpeiros e pescadores que, desrespeitando a lei, estão avançando sobre os territórios indígenas.

Esta situação de insegurança que aflige os povos indígenas de Roraima, foi discutida em uma reunião, ocorrida na semana passada, na comunidade Serrinha, no município de Caracaraí, com as lideranças indígenas do Limite Leste.
Nesta reunião as lideranças indígenas discutiram a ocupação das terras da União, já demarcadas pelo Governo Federal, e o resultado de uma expedição realizada, em outubro, na região do Ajarani, na fronteira da Terra Indígena Yanomami, para fazer o diagnóstico da situação na região.
Formada por membros da Hutukara Associação Yanomami, representantes da Fundação Nacional do Índio (Funai) e integrantes do Instituto Socioambiental (ISA), a expedição percorreu 280 quilômetros no leste da terra indígena colhendo dados sobre o estado de insegurança que esta situação vem causando.

Conforme a expedição, na região situada entre os rios Ajarani e Apiaú, há marcas de invasões de não indígenas, que revelam a abertura de picadas marcando os limites da TI Yanomami. De acordo com o vice-diretor da Hutukara, Maurício Yekuana, foi detectada a presença de pescadores e garimpeiros, especialmente na região do Apiaú, no município de Mucajaí.
Senhores senadores, a região do Ajarani, na Terra Indígena Yanomami, foi a porta de entrada para os primeiros contatos dos Yanomami com os brancos, que tiveram início no século XIX.
Estes contatos se intensificaram, se aprofundando mais no início da década de 1970, com a implantação, pelo governo militar, do Programa de Integração Nacional (PIN), que foi responsável pela construção de milhares de quilômetros de rodovias por toda a Amazônia, tais como a Transamazônica.

É desta época, a chegada do PIN no então Território de Roraima, com a rodovia Perimetral Norte, que ligaria o extremo nordeste do Brasil (Amapá) ao extremo noroeste amazônico, na região conhecida como Cabeça do Cachorro, em São Gabriel da Cachoeira, onde fica a Terra Indígena Alto Rio Negro. Até hoje, esta rodovia é utilizada para o acesso às comunidades indígenas.
O encontro do homem branco com o indígena, causou sérios problemas de ordem social, econômica e cultural. Nas décadas de 1970 e 1980, mais de 70% da população da região, que foi acometida de gripe, malária e outras verminoses, morreram por falta de assistência diferenciada à saúde.
A década de 1990 ficou marcada pelo crescimento demográfico, o que fragilizou, ainda mais, a terra indígena na região. Além de causar significativos impactos ambientais, a presença dos fazendeiros e a proximidade dos povos indígenas com não índios impuseram novas atividades produtivas.

Neste processo de invasões de terras indígenas, com o extermínio de suas culturas, também são vítimas os povos do Assentamento Massaranduba, que fica próximo da TI Yanomami.
A expedição diagnosticou uma organização, vinda do entorno da TI Yanomami na região do Ajarani, para invadir este assentamento. Por se constituir em um dos casos mais sérios na região, o tema também foi discutido com a Associação dos Produtores do Projeto de Assentamento Massaranduba.
Ali, os desmatamentos e as reservas de lotes de terras da União, comprovadas em imagens de vídeo, foram, felizmente, contidos pela ação da Funai, que convocou a Polícia Federal para agir imediatamente.
Estas invasões, senhores parlamentares, são reflexos da política de regularização fundiária que o governo do Estado vem fazendo, sem fiscalização e sem controle. Presente à reunião de Serrinha, em Caracaraí, o presidente da Hutukara, Davi Kopenawa, reclamou da situação provocada pelas frentes de expansão colonizadora do INCRA e por esta prática de distribuição de desordenada de terras no Estado.

São, bem sabemos nós, velhos problemas que geram mais medo e sofrimento e marcam terrivelmente a vida dos povos indígenas de Roraima, especialmente, os da Terra Indígena Yanomami, uma área do Governo Federal protegida da ação de não indígenas, mas sempre ameaçada.
Recentemente, com o apoio dos indígenas, a Funai realizou operação de retirada de mais de 40 garimpeiros da área. Os indígenas se ressentem do fato de a Funai não ter terminado a desintrusão da área.
A situação nos preocupa ainda mais, pois como sabemos, o drama dos povos Yanomami, é do conhecimento da opinião pública nacional e internacional. Agora, que estamos no limite, temos o desafio de agirmos, antes que algo de muito pior aconteça.

Conforme Moreno Saraiva, antropólogo do ISA, no Limite Leste da TI Yanomami ainda há regiões preservadas, sem o contato do homem, que possuem rios e matas preservadas e onde a caça continua.
Precisamos entrar em campo para protegermos a Terra Indígena Yanomami. Estas terras, nobres colegas, precisa estar livre da ação danosa de invasores que, como lembra Davi Kopenawa, só alimentam a ganância de querer a terra, a riqueza, o subsolo e a madeira.
O Instituto de Terras e Colonização de Roraima (Iteraima), que é responsável pela organização da terra no Estado, precisa dialogar com as partes envolvidas neste processo, antes que o pior venha a ocorrer.
O governo do Estado, que atua de forma não efetiva, precisa fiscalizar a área tem a obrigação administrativa de proteger as terras indígenas, que são, na verdade, terras da União e, como sabemos todos nós, estão constitucionalmente protegidas.

Era o que tinha a dizer, nobres colegas, com relação a este problema que chama a atenção da opinião pública internacional.
Muito obrigada.

Brasília/DF, 29 de novembro de 2012.

Senadora Ângela Portela