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G1: Ministério Público entrega sangue repatriado a líder yanomami

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21/09/2015 17h45 - Atualizado em 21/09/2015 18h04
Ministério Público entrega sangue repatriado a líder yanomami
Material foi colhido nos anos 60 por cientistas americanos sem aval dos índios.
Amostras retornarão a aldeia e serão enterradas em cerimônia religiosa.

Renan Ramalho Do G1, em Brasília


O Ministério Público Federal (MPF) entregou nesta segunda-feira (21) ao líder yanomami Davi Kopenawa um lote com 474 amostras de sangue indígena coletado por cientistas norte-americanos durante os anos 60 em aldeias da etnia localizadas na Amazônia brasileira.

Trata-se da segunda leva de material biológico entregue aos índios neste ano a partir de um acordo feito entre o MPF e universidades e institutos de pesquisa dos Estados Unidos. A caixa entregue nesta segunda veio do Instituto Nacional do Câncer, agência de pesquisa do governo sediada no estado de Maryland, vizinho à capital Washington.



O sangue indígena foi coletado há mais de 40 anos sem o consentimento dos índios e sem conhecimento do governo brasileiro, segundo os procuradores, que também não sabem exatamente que tipo de pesquisa foi feito com o material.

 

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"Nós não temos nenhuma informação. Foi coletado por um geneticista, mas não sabemos o que foi feito. O primeiro a coletar foi um antropólogo, que sofreu uma censura moral. Em relação ao geneticista, não conheço nenhum tipo de punição. Na época, não havia a Convenção 169, disse a subprocuradora-geral da República, Deborah Duprat, em referência ao ato da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que protege povos indígenas e tribais.

O material agora será enviado à aldeia para ser enterrado numa cerimônia religiosa. Segundo Davi Kopenawa, somente com o ritual considera-se que o indígena já falecido de quem foi colhido o sangue retornará ao seu local de origem.
Ninguém veio do céu, não. Viemos da terra, nascemos nessa terra, então temos que devolver esse sangue"

Davi Kopenawa,
líder yanomami

"Vamos levar de novo para a aldeia lá onde está minha tia, meu tio, minha mãe, meus irmãos. Estão lá esperando, vamos ficar muito contentes de novo, mas vai ter muita choradeira. O yanomami, quando ele vê [o sangue], se lembra, chora muito. E depois do choro, vamos ter uma pequena festa para agradecer nosso sangue que voltou ao Brasil. Ninguém veio do céu, não. Viemos da terra, nascemos nessa terra, então temos que devolver esse sangue", disse.


Em abril deste ano, a aldeia de Piaú, localizada na região de Toototobi, na divisa entre Amazonas e Roraima, realizou o enterro do primeiro lote de material que chegou ao Brasil, contendo 2.693 frascos de sangue, que estavam na Universidade Estadual da Pensilvânia. A cerimônia durou pouco mais de três horas, com o sangue derramado em um buraco cavado em um dos pilares de uma maloca.

Davi Kopenawa disse que também teve o sangue coletado quando tinha cerca de 10 anos de idade. O acordo para a repatriação foi resultado da iniciativa das próprias lideranças indígenas, que em 2002 procuraram o MPF.

A história da expedição para coleta do sangue yanomami foi narrada pelo jornalista Patrick Tierney no livro "Trevas no Eldorado", publicado em 2000, e contada no documentário "Segredos da Tribo", do cineasta José Padilha, lançado em 2010.